segunda-feira, 29 de abril de 2013

Açai da vida.


Nos primeiros sintomas reconhecíveis, o que acontece é aprender a se portar em solidão. Fazer as coisas sozinha, fazer companhia a si mesma e ser suficiente. Come-se só. Caminha-se só. Fala-se só. Sonha-se só e acorda-se só. Inevitavelmente mergulhado num fim de assunto, nascendo naquele silêncio constrangedor pra vida toda. Começa-se o dia assim. Solidão de manhã. 
Depois da tristeza, o choro e o caos, a calma vem tomar o ambiente. Aí vem a falsa compreensão, a aceitação e a calmaria. As coisas não parecem tão ruins, nem tão duras de se viver. Ao redor tudo parece estar voltando para o lugar, como se fossem coisas da vida voltando de uma balada, indo dormir cada uma na sua própria cama, sem bagunça, sem confusão. É o famoso “baixar da poeira”, sabe? Poeira tomando assento. 
E depois dessa calma, que infelizmente dura pouco e tem cara de alucinação, vem uma loucura quase alucinógena. A gente pensa coisa que ninguém disse, fica imaginando possibilidades impossíveis como praticamente reais e vai misturando as coisas sérias às quais deveríamos nos agarrar com um monte de besteiras e maluquices. Rajada de vento. Bagunçando tudo den’dicasa e den’da cabeça e do coração. 
A gente de repente ouve o barulho da mensagem chegando no celular, e não tem nada lá. Essa loucura, com todas as coisas fora do lugar começam a trazer vozes e dizeres que ninguém nos disse. Nossa mente fabrica uma outra realidade, onde todo mundo nos quer dizer algo, onde todas as coisas apitam e chacoalham por nós. Som de assombração. 
De repente tudo o que é preciso é sanidade. E ela que nos falta. Toda vez que o pensamento se alinha e as palavras voltam a se endireitar, no meio da razão, do pensamento lógico, o coração vem destruindo tudo, amolecendo todo o chão e tirando o alicerce. Coração sangrando toda palavra sã. Não sobre nada para se agarrar! Para ele, mesmo com toda a dor, ainda vale a pena o amor, a entrega, a loucura a dois e a viagem ao centro do que ninguém conhece. A paixão, puro afã! 
Não há uma só pessoa que saiba explicar o que é a intensidade da paixão, pra onde é que vai o nosso orgulho, o amor próprio, quando estamos no meio desse turbilhão. No início pensamos ter encontrado a mágica do mundo, o enigma do milênio, um místico clã de sereia. Depois as coisas começam a desmoronar, ir mal, perderem a cor e a forma, como um castelo de areia contra o tempo. No fim só sobra o desejo da vingança, o rancor, a dor visceral e a fúria, ira de tubarão. Tudo uma grande ilusão, com certeza. 
“O Sol brilha pra todos”, diriam, antes de dizer que tudo se ajeita e que vai ficar tudo bem. Na verdade, o Sol brilha por si. E por mais ninguém. A gente só se aproveita dele, mas ele não o faz por nossa causa. E aí, quando cai a ficha, estamos sozinhos mesmo, nem o Sol está ligando, e os dias começam a entrar nos eixos. E vamos saindo, aniversário de amigo, exposição de arte, e até coisas mais simples, tipo, bicicleta, passeio no parque, açaí. A vida, de carrasca passa a ser nossa guardiã, nos dá calma para ouvir o som dos pássaros, do vento, o zum de besouro. Nos tornamos um imã de coisas boas novamente
Passam os dias, aprece outra pessoa, outros dias, outros planos, outros sorrisos, outras viagens, outros amigos, outras roupas, outros restaurantes, outros parques, outras ideias, outras posições, outras sensações, outras cores, outras vontades, outros planos, outros destinos, outra textura, outro sabor, outros olhos, outra voz, outros coração e, de repente, do fundo da escuridão, podemos cantar, junto com o Djavan, que "branca é a tez da manhã", e vivermos felizes.

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