Não gosto de incentivar o consumo, nem a riqueza, nem a
acumulação, mas não posso ignorar o fato de que objetos são importantes e
necessários. Os objetos de uma pessoa dizem muito sobre ela, inclusive, que ela
tem objetos demais, em alguns casos. Você consegue saber, mais ou menos, como é
uma pessoa pelas músicas que ela ouve, ou pelos lugares que ela vai, mas fica
muito mais fácil se você souber como ela se veste e o que ela carrega dentro da
bolsa, da mochila, dos bolsos, enfim. Os objetos das pessoas dizem coisas sobre
seus donos.
Mais do que significar estilos, preferências e opiniões,
os objetos de alguém presenciam coisas muito íntimas que talvez ninguém mais
saiba. As escolhas mais importantes, os planos mais intensos e as ideias mais
brilhantes, acredito eu, surgem sempre em momentos de solidão. Num quarto, numa
sala, numa mesa, dentro de um carro. São situações que acreditamos estar
completamente solitários, mas que sempre estão sendo assistidas por dezenas, às
vezes cetenas, de objetos. E se pudéssemos conversar com eles, obter
informações, saberíamos mais sobre as pessoas do que elas mesmas.
Imagine quanta coisa não sabem os óculos da presidente
Dilma. Quantas reuniões a portas fechadas eles já não assistiram? Quantos
documentos confidenciais eles já não leram? Os objetos pessoais de alguém,
muitas vezes, valem mais do que eles mesmos. Imagine quantas histórias os
carros de Formula 1 não poderiam contar sobre seus pilotos, sobre as corridas,
sobre as equipes, os mecânicos e até mesmo sobre as organizações e o grande
circo da corrida? Imagina quanta coisa o capacete do Schumacher já não
viu, ouviu e viveu? Pense em quantas noitadas inacreditáveis o isqueiro do
Keith Richards já não curtiu. Pense em quantos quartos de hotel ele já não
iluminou com sua chama, quantas ameaças e
quantos palcos ele já não viu?
E não precisa ser só gente mega famosa assim não. Esse texto,
na verdade, nasceu de uma reflexão minha sobre alguns amigos e pessoas que
conheço. Gente que é tão voraz na vivência com certos artigos que seriam
capazes de deixar a história das próprias vidas na boca de um único objeto.
Comecei, de fato, me perguntando “quanta história os tênis de gente como a
Paula Narvaez poderia contar”. Quantas chuvas a bicicleta de gente como a Isa
Garaventa já não tomaram? Quanta festa os sapatos de pessoas como Flávia Carvalho e Tassy Sasso já
não curtiram? Penso em quanta mágica os pincéis da Dani Fialho não fizeram,
quanto coração partido o violão do Fe Barscevicius já não musicou e quanto
absurdo e desilusão meu teclado já não decifrou?
Os objetos de alguém são o novo “diga-me com quem tu
andas e te direi quem és”. Vem conversar com o meu quadro aqui no meu quarto e você vai ver a quantidade de coisas que ninguém sabia
sobre mim.
Converse com a câmera de um fotógrafo, com o computador de um designer, com o
instrumento de um músico, com os pincéis de
uma maquiadora, com as luvas de um pugilista e dispense a conversa com qualquer
uma dessas pessoas. Não será mais necessário.